Quando criança, lembro bem que minha maior curiosidade – e também maior medo – eram as giras de Esquerda. As luzes se apagavam e algumas vezes não podíamos participar. Hoje, tempos depois, não quero levar isso adiante, não quero que minhas filhas ou as crianças que frequentam nossa casa sejam acometidas pelos mesmos medos. Hoje compreendo que as gargalhadas dos senhores Exús e das senhoras Pombagiras têm um porquê de ser no astral, sua ressonância e sua imponência delimitam o espaço onde imperam e principalmente a quem protegem.
Todos nós buscamos a evolução, inclusive nossas entidades espirituais. Nos tempos de hoje já não precisamos mais apagar as luzes em um trabalho com a linha da Esquerda, respeito às casas que o fazem, mas penso que nossos trabalhadores da Esquerda, que atuam na Lei, também têm a sua luz.
É chegada a hora onde não podemos mais confundir esses trabalhadores da Lei, Exús, Pombagiras e Mirins com quiumbas, que são espíritos inferiores que trabalham para o mal, sem se importar com as consequências.
Para explicar melhor nossos orixás à Esquerda, recorremos à Bíblia Sagrada, em Gênesis “No princípio criou Deus o céu e a terra. E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. E disse Deus: Haja luz; e houve luz.” Dessa forma, encontramos os mistérios de Exú, o vazio, as trevas. Orixá que vem nos proteger, abrir nossos caminhos, aguçar nossa intuição contra os perigos do dia a dia. Tudo está em Deus, Deus nos criou a partir de uma célula. Essa célula passou por transformações e diferentes planos da vida até chegar a como hoje estamos. No meio humano em que vivemos, de acordo com nossas ações, podemos desestruturar e deformar nosso espírito até se transformar em aberrações, que se iniciam em nossa mente. É o caso de assassinos. Exú é quem vai transitar por todos os mundos e vai buscar nas trevas os espíritos caídos que desperdiçaram sua passagem na Terra praticando o mal, prejudicando seus irmãos e colocando-o em uma nova situação a fim de buscar a evolução. Justamente por serem mensageiros, encontramos Exús trabalhadores em todas as linhas de trabalho, Pretos-Velhos, Baianos, Boiadeiros…
CARACTERÍSTICAS
Precisamos entender e enfatizar que os Exús são trabalhadores e não só podem como devem trabalhar na caridade, esgotando, ativando e revigorando. Aliás, aí está sua maior atuação: a vitalidade.
Muitos terreiros usam em suas tronqueiras imagens de Exús amedrontadoras, com chifres, rabo ou órgãos genitais à mostra. Meu papel não é criticar, mas sim fazer diferente em minha casa. Hoje compreendo que a igreja católica sempre buscou uma forma de amedrontar seus fiéis e isso acontece desde que o mundo é mundo. Usar imagens horripilantes para mostrar que devemos andar na linha, fazer o bem para não ir para o inferno, mas o que Exú nos mostra é que o mal vive dentro de nós.
Ainda recebemos consulentes em nossa casa buscando o mal para saciar sua vingança. Os Exús são entidades muito poderosas e qualquer um que utilize sua energia de maneira desenfreada pode ter um desequilíbrio energético muito profundo. Nunca devemos nos esquecer que maior que todos os nossos desejos mais mesquinhos é a lei da ação e reação, a lei do retorno. O que se faz aqui, aqui será resolvido e quando menos se espera.
ATUAÇÃO
Na Umbanda acreditamos no carma e também o médium pode acelerar seu carma trabalhando. Os Exús e Pombagiras são aplicadores do carma na vida das pessoas por esse motivo são confundidos também com o demônio ou o mal. Exús e Pombagiras são orixás do trono cósmico pois têm o poder desvitalizador e esgotador de cada orixá. As Pombagiras trabalham de forma a aplicar a lei também, juntamente com Exú. Ambos não polarizam, mas se completam, cada um tem o seu trono e suas polaridades que ainda não nos é permitido conhecer.
Pombagira é um orixá estritamente brasileiro, não reconhecido nos cultos de nação. É a guardiã do mistério do desejo e aplicadora da lei e do carma de cada indivíduo.
Muitas dessas maravilhosas entidades já viveram encarnadas em nosso meio humano e assim como os Exús trabalham para sua própria evolução e cuidam de servir os orixás no qual estão ligadas.
POMBAGIRAS
As Pombagiras vêm de um trono neutro, nem bom nem ruim, e respondem de acordo com que são ativadas. Em seu campo de atuação podem esgotar ou magnetizar, irradiar ou energizar. Assim como Exú responde pelo trono da vitalidade, Pombagira responde pelo trono do desejo. Vale lembrar que o fator desejo está em todos os aspectos de nossas vidas: desejamos um emprego melhor, um casamento feliz, desejamos filhos saudáveis… Assim Pombagira se apresenta em nossa vida. Vamos trabalhar para que a cada dia essa maravilhosa orixá não seja mais vista como prostituta, mulher da vida, mas sim como uma excelente trabalhadora que vem nos acudir quando estamos em apuros.
EXÚ MIRIM
No caso dos Exús Mirins, precisamos lembrar o início das incorporações umbandistas. Pouco se sabia sobre os espíritos que se apresentavam para trabalhar em nome da caridade e do amor. Com o passar do tempo e com a incorporação cada vez maior de entidades diferentes, os Exús Mirins tornaram-se entidades marginalizadas ou que não eram bem-vindas em determinados terreiros. Exatamente por pouco se saber desse orixá, muitas vezes foram chamados de crianças mal educadas, confundidos com crianças de rua que, desencarnadas, traziam seus vícios e traquinagens. Hoje temos condições de esclarecer que Exú Mirim também é um orixá que trabalha à esquerda e serve os orixás da direita. São seres encantados, ou seja, nunca estiveram encarnados e muito do que apresentam quando incorporados faz parte do inconsciente de seu médium.
Excelentes trabalhadores de Exús e Pombagiras, são requisitados para trabalhos de cura, afastar espíritos fofoqueiros, zombeteiros ou que queiram causar arruaça. Não apreciam trabalhos de magia negra ou demandas. São exímios trabalhadores do campo da cura e limpeza energética. Cabe ao médium transformar o seu inconsciente para que assim, principalmente seu Exú Mirim se aproxime e trabalhe sempre em prol do bem.
Os Exús Mirins não pedem firmezas e apreciam ser oferendados na natureza. As pombagiras mirins, ou moças mirins, ao contrário dos Exús Mirins são muito discretas e observadoras. Trabalham principalmente em prol de seus médiuns, ao qual defendem com muita veemência. Dificilmente é notada em uma gira, mas seus trabalhos são poderosos e doutrinadores.
CONCLUSÃO
A todos nós é chegada a hora do aprendizado e aquele que virar as costas a ele, não poderá mais tarde sentir-se vítima de determinada circunstância. Hoje, os mistérios estão mais revelados do que há cem anos. Quem tiver disposição e um pouco de boa vontade, será recompensado pelas leis Divinas.
Para finalizar, deixo um trecho do livro Guardião da Meia-Noite (Rubens Saraceni, Editora Madras)
(…)“Se eu precisar de seu auxilio não terei vergonha em lhe pedir pois por terem vergonha muitos morrem. Morrem por terem desejado algo e não terem provado seu gosto. Vergonha não faz parte do meu vocabulário e a palavra que mais prezo é a que se chama “respeito”. Aja assim e não será traído nem odiado, mas respeitado. Nem os maiores passarão por cima de você e nem os menores lhe escaparão”.
Marisa Firmino da S. Sanches